WRIGHT, N. T. The Original Jesus. The life and vision of a revolutionary. Eerdmans. Michigan: 1996, 160 páginas (Não publicado no Brasil).
Nicholas Tomas Wright, nascido em 1 de dezembro de 1948, comumente chamado na academia por “Tom” Wright, é teólogo e clérigo anglicano. É doutor em Estudos no Novo Testamento pela Universidade de Oxford tendo sido agraciado com vários doctor in honoris causa. Durante vários anos foi bispo da diocese de Durham, teólogo cânone da Abadia de Westminster, Deão da Catedral de Lichfield, além de ter lecionado no McGill Univertity em Toronto, e na própria Universidade de Oxford. É considerado uma das maiores autoridades em Estudos no Novo Testamento, Nova Perspectiva de Paulo, e a Questão do Jesus Histórico. Embora seja relativamente pouco conhecido no Brasil, sua influência acadêmica é grande nos países de fala inglesa. Entre os seus escritos destacam-se: Justification, What St. Paul really said, The Climax of Covenant, e a série sobre as origens do cristianismo (The New Testament and the People of God: Christian Origins and the Question of God; Jesus and the Victory of God: Christian Origins and the Question of God e The Resurrection of the Son of God: Christian Origins and the Question of God). Atualmente, ocupada a cátedra de Estudos no Novo Testamento e Cristianismo Primitivo da St. Andrews University na Escócia desde 2010.
O livro é fruto de duas experiências: a gravação da série da BBC sobre as origens do cristianismo e sobre Jesus e também do seu trabalho acadêmico sobre o mesmo tema, particularmente o livro: The New Testament and the People of God (1992).
A obra se divide em duas partes. Na primeira, Wright faz uma análise concisa da questão do “Jesus Original”. Na segunda parte, o autor faz um convite à leitura dos Evangelhos “com os olhos abertos”, ou seja, de maneira holística, mas ao mesmo tempo, entendendo as ênfases teológicas apresentadas pelos quatro evangelistas. A presente resenha se concentrará na primeira parte.
De uma maneira bem informal e de fácil leitura, a questão que Wright tenta desenvolver está baseada em um enigma: como a morte de uma pessoa a dois milênios, numa cultura e num lugar diferente do nosso pode ser relevante para as pessoas que vivem no séc. XX? (o livro foi escrito em 1996). Esse é o questionamento levantado pelo autor, que admirando a cidade de Jerusalém, onde Cristo fora morto, reflete sobre as conseqüências para a história e para o presente dessa morte.
O capítulo 2 do livro Tom Wright nos relata a história anterior ao do próprio Cristo, ou seja, de João Batista. Nesse capítulo que tem como título “O Ponto mais baixo da História”[1], temos um pouco do cenário histórico-social-religioso do período pós-Segundo Templo: o retorno do exílio, o domínio romanos, os manuscritos do Mar Morto e de grupos messiânicos radicais. Nesse cenário, João Batista emerge da história como alguém com uma missão bem específica: purificar, através do batismo e anunciar um novo momento histórico: a vinda daquele que seria o messias e que traria com ele um novo Reino. De acordo com Wright, Jesus, no início foi adepto ao movimento de João Batista, mas quando ele foi preso “Jesus respirou fundo e começou seu próprio movimento independente”[2].
O capítulo 3 nos apresenta um problema relacionado à história de Jesus. De acordo com Wright:
“as pessoas dizem que as histórias de Jesus eram apenas histórias terrenas com significados celestiais. Mas isso é besteira! Histórias são muito mais poderosas do que isso. Histórias criam palavras. Conte uma história de maneira diferente, e você também mudará as palavras. E é isso que Jesus queria fazer”.
Baseado na parábola do Filho pródigo e na celebração que se fez no fim dessa história, Jesus estava, de acordo com o autor, apontando para o fato de haver um motivo para a festa: Ele estava trazendo o Reino de Deus. Jesus fora severamente criticado pelos guardiões das antigas tradições porque ele celebrou o Reino não com os justos e nem com a elite religiosa, mas com os excluídos e marginalizados de seu tempo[3]. As histórias que Jesus contou revelavam um Reino de Deus com novas regras que mudavam drasticamente toda a tradição estabelecida até então. É a partir disso que podemos entender o por quê Wright usa a palavra “revolucionário” para a pessoa de Cristo.
O quarto capítulo Wright continua a desenvolver sua visão de um Jesus Revolucionário baseado no Sermão da Montanha relatado em Mt 4:23, 25; 5:1~16, 38~45. Muitos lêem esse sermão como um mero ensino ético de Cristo. Porém, na visão de Wright, é semelhante a um manifesto revolucionário político. Desafiando a elite religiosa de seu tempo, Cristo apresenta uma nova maneira de ser “povo de Deus” a partir do momento em que Ele declara que as bênçãos divinas estavam sobre os pobres, sobre os que choram, aqueles que são sedentos por justiça, os perseguidos, etc. Segundo o autor, a maior “bomba” que Jesus detonou sobre os religiosos foi deslocar o centro da adoração do templo para a sua próprio pessoa-palavra quando ele diz que aqueles que o ouvem constroem suas casas sobre a Rocha. O centro do Reino de Deus não era mais o Templo de Jerusalém, mas a Palavra de Cristo revelada no Evangelho.
Contuniando a ideia de “deslocamento de centro”, o capítulo 5 traz uma análise interessante sobre aquilo que Wright chama de “Centro do Cosmos”. Qual era esse centro para o Judaísmo do Segundo Templo, na época de Jesus? Simples, era Jerusalém; afinal o Templo estava nessa cidade, e era para lá que os peregrinos iam nas festas religiosas solenes como a páscoa e o Yom Kippur. Entretanto, o cerne da Revolução de Jesus estava em estabelecer o centro do novo “povo de Deus” em si mesmo. Foi essa a intenção, por exemplo de Marcos, ao relatar a confissão de Pedro em Cesareia de Felipe[4]. A vida de Jesus, a sua morte e ressurreição deslocariam esse centro de uma cidade física e humana para a própria pessoa de Cristo.
O capítulo 6 tem o título “De volta ao jardim”. O ponto central é a morte e a ressurreição de Cristo. Segundo Wright, a concepção de ressurreição na cosmovisão judaica da época era que “Deus ressuscitaria seu povo para uma nova vida, quando ele finalmente mudaria o mundo inteiro estabelecendo justiça e paz para Israel em particular (…) Ninguém imaginaria que a ‘ressurreição’ significaria a ressurreição de uma só pessoa no meio da História”[5]. Os discípulos de Jesus, por exemplo, não esperavam a morte tão repentina de Cristo, e uma vez Jesus morto, não esperavam a sua ressurreição. Mas por que a ressurreição é um evento tão central? A ressurreição é a confirmação cabal do Reino de Deus para a qual os discípulos foram convidados a fazer parte. A simples morte de Cristo resultaria no fim do movimento de Jesus. Entretanto, sua ressurreição significou o fôlego necessário para que os discípulos continuassem sem Jesus, mas com o Espírito Santo, a ampliação desse reino constituído a partir de pessoas humildes e não do establishment religioso.
O último capítulo que fala da questão do Jesus Histórico é intitulado “Deus com uma face humana”. Para Wright o ponto fundamental para conhecermos o “Jesus Original” é nos aproximarmos de um Jesus que tem a face do Deus Vivo. Argumentando com o “Jesus Seminar” (de posição teológica antagônica com a de Wright), o autor expressa que não é suficiente entendermos Jesus Cristo apenas como um contador de histórias, como se essas histórias fossem contos éticos que nos ajudariam na caminhada da fé, pelo contrário, devemos crer e aceitar que Deus estava “pessoalmente presente em Jesus”[6]. A igreja é formada por pessoas que, mediante suas palavras, histórias, símbolos e ações revelam ao mundo a relação entre Deus e Jesus, culminando na declaração de Paulo em 2Co 5:19: “Deus estava em Cristo reconciliando consigo o mundo”.
Concluindo a apresentação da obra, podemos dizer que Wright escreve de maneira bem acessível a todos, fugindo de terminologias teológicas complicadas e de um academicismo exagerado. Mesmo sendo de simples leitura, o estudo de Wright é baseado em anos de pesquisas na área do Jesus Histórico, o que torna esse instigante tema acessível a todos.
O foco da obra é que qualquer pessoa, seja ela cristã ou não, entenda facilmente acerca da pessoa de Cristo e sua inserção dentro dos Evangelhos. O convite que Wright faz aos seus leitores, instigados pelas suas proposições, é que eles leiam os Evangelhos de capa a capa se esforçando para que as verdades apresentadas ganhem sentido e entendendo o que cada evangelista está dizendo como um todo.
[1] Tradução livre, como em todos as citações de trechos da obra.